Esta publicação é um tributo a uma amiga querida e muito especial "Marta Bolivar". Infelizmente ela não está mais entre nós, mas nos deixou pérolas como essa. Quis Deus em sua máxima sabedoria, levá-la para alegrar e encantar o seu reino.
VELHO /NOVO TEMPO. CANSEI !!! por Marta Bolivar
Cansei da violência. Dos abusos sem conseqüências.
Dos não-direitos e não-deveres.
Cansei do sarcasmo da impunidade garantida por
pseudo-autoridades.
Cansei de tragédias.
De crianças pré-fabricadas no marketing de griffes
principescas de trapos medíocres,
sem sonhos e surdas. Fantasiadas de adultos e
mandando nos pais infantis.
Cansei do novo feito de retalhos velhos, rotos.
Do barulho alienante e agressivo. Dos ouvidos
moucos...
Cansei das frases feitas. De consagração de tanta
estupidez.
Cansei dos adesivos bíblicos e chavões queimando o
filme de Jesus e Deus.
Cansei dos deuses à imagem e semelhança do homem e
das coisas.
Cansei da hipocrisia e poder de religiões, seitas,
da empáfia das instituições de Igrejas donas de Deus.
Cansei da "Lei de Gerson" e do valor das
aparências. De "belas violas e pães bolorentos".
Cansei de mim. De amar na contramão de valores na
moda.
De receitinhas de auto-ajuda.
De festas sem coração e sem música: só barulho,
droga e pegação.
De respostas prontas e simplórias.
De doenças incuráveis. Da relação humana incurável.
Do faz-de-conta que tudo está bem e do parecer que
se é alto astral e de bem com a vida.
De mentira fantasiada de verdade.
De gente burra e sem alma. Da ignorância. De bunda, cerveja e futebol.
Da vagabundagem de mulheres que se dizem livres.
De todos iguais e discordantes em vez de desiguais
e concordantes.
Cansei.
Dos tele-marketings.
De Bancos bilionários e ladrões.
Das massas que obedecem à Mídia que dita valores e
traça normas
e condutas a seu bel-prazer e interesse do Ibope.
De sexo explícito.
Do lambe-lambe dos filmes e novelas.
Da exaltação dos cretinos.
De meias-medidas e meias palavras. De
mal-entendidos.
De empregados interesseiros e safados.
Estou cheia desta minha terra sem lei e da lei sem
justiça. Atrasada!
Cheia e cansada.
De aposentadorias-relâmpago e faraônicas de
imprestáveis e
soldo
miserável de quem ralou a vida inteira, idosos esquecidos e maltratados.
Cheia do medo. Dos tiros atingindo quem não era
alvo.
De armas recolhidas e repassadas a bandidos.
Dos rios podres secando. De Natureza morta.
Da mentira da transposição do Rio São Francisco em
agonia
para propaganda de Governo atendendo a minorias.
E do povo satisfeito com esmolas.
Cheia dos Talibãs, Chávez, Jihad, Lulas, dos
malditos partidos políticos ridículos
de votos vendidos e comprados, dos Bush, de
guerras,
dos delinquentes de classe média,
das falsas igualdades em produtos de 3ª – em
camelódromos oficiais.
Horrivelmente cansada dos terrores do dia-a-dia,
da história sangrenta repetida,
dos ''Bin Laden'' da vida sustentando acéfalos
assassinos, desses kamikases modernos
estraçalhando pessoas e cidades, crianças e
inocentes,
de vagabundos matando por nada e roubando o pão
ganho com suor.
Dos modelos e utopias vazias.
Das masturbações a dois, a dez, a mil. Milhões...
Dos traficantes mantidos e mantendo poderes
oficiais.
Cansei de remédios que não curam. Da frieza e
açougue de tantos
médicos e hospitais.
De profissionais picaretas.
Dos vacinados e indiferentes, raça miserável!
Dos carros bonitinhos e ordinários.
De índios bebendo e se matando por falta de vida,
espaço e sentido.
De mendigos que amam mendigar, dos sem-vergonha,
sem escrúpulos.
De ficar atrás de grades e cercas elétricas,
alarmes, em casa.
De ver gente enchendo a cara desde cedo.
De "maconheiros" criticando cigarro e de
cigarro-fonte-de-todos-os-males.
Cansei de ver tanto desperdício e esbanjamento. Do
descartável sem proveito depois.
Cansei - e
me dói - ver gente jogando fora miolo de pão e comida que sobrou no prato.
Cansei dos saciados!
De revoluções desumanas que só mudam a cor dos
uniformes sob o medo e a morte.
De tantos mercenários.
De patriotismo barato de caras lavadas ou pintadas.
De passado que devia estar morto e enterrado voltar
como zumbi.
Dos filmes de terror e violência sarcástica. De
ironia.
De executivos de merda sem tempo e escrúpulo.
De Campeonatos e jogadores
profissionais vendidos por milhões de euros e dólares
que fazem do esporte uma
guerra.
Estou cheia das comidas
japonesas bonitinhas amassadas com mão suja,
dos fast-food da vida, sem
opção e sem graça;
da Natureza agonizando, de
tsunamis e terremotos, das florestas desaparecendo,
horrorizada de saber que há
espécies inteiras se extinguindo no planeta a cada dia.
De dirigir em estradas
perigosas e lotadas de buracos e loucos ao volante,
de aviões voando para a
morte
e do jogo de empurra.
De caminhos propagandeados
que levam a nada.
De cargos políticos com
gente corrupta e incapaz gerando caos e morte.
De gente indefesa jogada à
própria sorte.
O dia está quase
amanhecendo.
E eu aqui. Cansada. E
escrevendo.
Para descansar e clarear um
pouco a mente.
O sol já vem, ao sabor do
aquecimento global.
O jornal trará velhas
notícias, muita propaganda, sangue e suor.
Preciso amanhecer!
O dia vai ser um pouco
diferente, como cada dia.
Mas, no fundo, nada es nuevo bajo el sol.
Não tenho muita ilusão.
Verei muita merda e ouvirei
outras.
Provavelmente darei minha
contribuição também nessa merda toda...
Mas não quero amanhecer
cega, surda e burra – sem hoje ou amanhã.
Vou sair olhando e querendo
ver que há mais do que só cansaço pobre.
Curtir humor inteligente e
sensível.
Enriquecer o cansaço trabalhando,
tentando criar algo que
faça valer a pena viver,
estar viva.
Não quero estar distraída,
esquecida, sem malícia.
Preciso estar de coração
mais aberto e flexível para ver a vida,
buscar vida – mesmo
escondida em cada medo ou morte.
Navegar na memória do bom e
bonito,
lembrar gente boa, os que
amo e me amam,
os que amam: pessoas humanas raras e preciosas,
e ter algum prazer que me
alimente.
Terei saudade, mas quero
que seja doce.
Em algum momento serei eu e
humana.
Talvez consiga rezar.
Apesar dos pesares tenho
tanto a agradecer a Deus.
Estarei e me sentirei
cansada. Dormi pouco. Pensei muito.
Mas estou viva.
Quem sabe consigo soprar a
chama, para que brilhe mais ?!
Ou até consiga crer e esperar,
mesmo contra toda esperança ?!
Contarei a noite também
pelas estrelas e elas vão sorrir.
Lembrarei Citadelle e
Éxupéry.
Assim não vou maldizer a
escuridão.
Afinal, estrelas mortas há
séculos estão iluminando o céu...
O Homem não é de todo
maldito, afinal.
Há razões de esperar,
creio. Sei.
E vou seguir. Teimosa.
Cansada, mas sem desespero,
tentando me equilibrar
na corda bamba de centelhas
de esperança caduca.
Vou caducando.
Mas vou!