Odete Soares Rangel
É a vaidade, Fábio, nesta vida,
Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.
Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.
É planta, que de abril favorecida,
Por mares de soberba desatada,
Florida galeota empavesada,
Sulca ufana, navega destemida.
Por mares de soberba desatada,
Florida galeota empavesada,
Sulca ufana, navega destemida.
É nau enfim, que em breve ligeireza
Com presunção de Fênix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza:
Com presunção de Fênix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza:
Mas ser planta, ser rosa, nau vistosa
De que importa, se aguarda sem defesa
Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?
(Gregório de Matos)
De que importa, se aguarda sem defesa
Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?
(Gregório de Matos)
O soneto em seu título faz alusão a metáfora. Mas o que quer dizer com desenganos da vida humana? Desengano significa desilusão, a vaidade é um desses desenganos, esse desejo de admiração pode até se concretizar, mas com a mesma rapidez que surge, esvai-se como a vida com sua finitude, deixando um imenso vazio, um desejo de algo real. A efemeridade e a finitude da vida permeiam o soneto e levam a um questionamento, de que vale ser vaidoso, se a morte é inexorável ?
É no trinômio efêmero: rosa, planta e nau (metáforas da vaidade) que o poema se desenvolve. E também que o poeta explica a Fábio o que é a vaidade. Afirma que ela é rosa (primeiro quarteto), que é planta (segundo quarteto) e que é nau (primeiro terceto).
Mas vejam o ambiente dessa rosa, ela é especial, está desabrochando, é real, enquanto que a vaidade é a beleza aparente que seduz, brilha como púrpura, mas tem um efeito passageiro.
A vaidade é planta, e por ser primavera sua aparência é mais viçosa. Assim, a vaidade é esplendor que se exibe pela vida com orgulho, mas que sempre tem um fim próximo.
Mas quando ele afirma que ela é nau, quer mostrar que o ser humano vaidoso embora tenha a presunção da perpetuidade, valoriza os brilhos exteriores, porém efêmeros.
(Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?) Vejam que há uma inversão na ordem dos termos que eram rosa, planta e nau, o que pode indicar um desejo de renascimento. O soneto acaba com um ponto de interrogação como que para levar o leitor a buscar a compreensão do poema, como que implorando para que ele veja que o poema tem muito mais significado do que o expresso nessas palavras, fios condutores do soneto. Entretanto, resume os acontecimentos penha indicando o naufrágio do navio, ferro o corte da planta, e tarde o murchar da rosa (durante o dia está em todo o seu esplendor, brilhando como o sol) ratificando a efemeridade da vida dos seres.
Esse soneto permeado de metáforas deixa um questionamento real. O que quero para minha vida? Ser vaidoso ou eu mesmo? O que de fato preencherá minha alma e alimentará meu espírito? Pois é isso que vai contar na hora da partida. Pense nisso!
Vocabulário:
- Airosa = esbelto, gracioso
- Soberba = orgulho, altivez
- Galheota = pequena embarcação a remo, usada para o transporte do rei.
- Presumida = vaidosa
- De abril favorecida = favorecida pela primavera que inicia em abril na Europa.
- Empavesado = enfeitado, adornado, guarnecido de paveses (=proteção nas embracações)
- Ufana = que se orgulha de algo, vaidoso
- Fênix = divindade da mitologia egípicia, símbolo da imoertalidade, personificada em uma ave que renascia das próprias cinzas.
- Galhardia = garbo, elegância
- Aprestar = preparar com prontidão
- Alento = sopro, bafejo
- Penha = penhasco, rochedo
PLATÃO & FIORIN. Para entender o texto: leitura e redação. 2.ed. São Paulo: Ática, 1997.
3 comentários:
Olá. Tenho uma dúvida: quando explicavas sobre o encerramento do poema, mais especificamente sobre o que o ferro indicava referindo-se a planta, por que "o corte da planta"? Não consegui fazer uma relação entre o ferro e a planta, entre o cortar da planta. Poderia me explicar, por obséquio? Muito obrigada!
Boa noite,
A vaidade, metaforicamente é vista como "rosa, planta e nau". A vaidade é tão fugaz, quanto é efêmera a vida de um mortal. "De que importa, se aguarda sem defesa". Entendo que, essa espera com a certeza de que não poderá se defender, é uma aceitação do seu fim. Ela não é uma Fênix e não vai renascer das cinzas. A vaidade se choca com a penha, recebe o corte com o machado feito de ferro e a planta ceifada faz a rosa murchar ao cair da tarde.
Espero ter esclarecido.
Abraço a todos.
Que tipo de poema lírico é esse? Estou fazendo uma pesquisa escolar. Desde já muito obrigada!
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