Odete Soares Rangel
A tarefa de produzir textos ainda é considerada um mito por muitas pessoas. Não se trata de uma tarefa fácil, nem difícil, mas, de uma tarefa que, fundamentalmente, depende da competência textual de cada produtor. A produção escolar escrita vem afligindo não só pensadores, pesquisadores e professores, mas os próprios alunos quando reconhecem que essa dificuldade os impede de avançarem em determinadas tarefas. E já há uma extensa bibliografia sobre o assunto. Na obra “Problemas de Redação”, Alcir Pécora discorre sobre um curso ministrado por Michel Lahud aos alunos do 8° semestre do curso de graduação em letras da UNICAMP, cuja proposta foi a leitura e fichamento de um texto da área lingüística e de outros citados pelo primeiro para confronto. Ao final, ficou comprovado que a maioria deles não sabia ler nem escrever, fato que os teria surpreendido, pois não se sentiram capacitados para interpretar um texto básico e dissertar sobre ele. Ele, também, faz um diagnóstico de redações de vestibulandos (1976) e de alunos do curso de Prática de Produção de Textos – 1° e 2° semestres – do ciclo básico do IEL, nos anos de 1978-80. Igualmente, constatou problemas dos mais diversos nessas produções textuais. Costa Val em “Redação e textualidade” analisa redações de alunos que prestaram vestibular na UFMG em janeiro de 1983, nas quais também constata diversos problemas com a produção escrita. Em qualquer teórico lê-se que escrever é uma habilidade que deve ser desenvolvida, quanto mais treino, melhor será o resultado. Mas, acima de tudo, produzir textos é sempre uma atividade desafiadora e fascinante.
Esse foi o tema escolhido pelos alunos do curso de letras desta instituição Odete Soares Rangel e Rafael Finamor, para a aula prática exigida na “Atividade Acadêmica Curricular - Educação com Informática” no quinto semestre do curso de letras. O projeto desenvolvido foi implementado na escola “Instituto João XXIII” em Porto Alegre, envolvendo a totalidade dos alunos das séries 7° A e 7° C. Para desenvolvê-lo, os alunos do UniRitter selecionaram entre os materiais pesquisados as obras “O cabeça de elefante e outras histórias da mitologia indiana” e “Dezenove poemas desengonçados” dos autores Lúcia F. de Almeida e Ricardo Azevedo, respectivamente. Como os próprios títulos prevêem, a primeira contém histórias da mitologia indiana; a segunda se compõe de poemas vinculados a ilustrações. Para ministrar a aula, eles desenvolveram um software composto por três das histórias das quais uma foi adaptada para que o texto fizesse sentido e quatro ilustrações dos poemas sem os respectivos textos e títulos. Assim, os alunos do “Instituto João XXIII”, sob sua ótica, produziram textos reescrevendo as histórias sobre mitologia ou criando outras a partir dessas ilustrações, porém utilizando a informática.
Os alunos daquela instituição já possuíam um bom domínio de recursos da informática, como Word, Power Point e caminhos de navegação no sistema. Assim, o uso dessa ferramenta foi de fundamental importância para o êxito da atividade, porquanto os alunos não estão acostumados a produzirem trabalhos manuscritos. Acessar com rapidez o material a ser trabalhado, voltando à ilustração ou ao texto quando necessário, foi um recurso bastante explorado por eles. Muito provavelmente, eles se rebelariam contra qualquer outra ferramenta utilizada ou não fariam a tarefa com a mesma disponibilidade e satisfação.
O trabalho foi desenvolvido em dois dias, totalizando três períodos-aula com cada turma. Além de não terem apresentado dificuldades para produzir os textos, os alunos registraram nesses, questões bastante relevantes, como relações familiares, homossexualismo, drogas, maníaco de parque e outras, demonstrando que estão conectados com os acontecimentos e com a realidade social. Também demonstraram ser bastante criativos nas suas histórias. Um fator que chamou a atenção foi a percepção deles, pois as mesmas ilustrações foram vistas por cada um sob ângulos completamente diversos. Essa nova interpretação das ilustrações feitas por alguns deles, reafirma nossa certeza de que os textos e imagens possuem fontes inesgotáveis que se bem exploradas possibilitam inúmeras leituras.
Por outro lado, reside aí a criatividade que faz um link com a realidade e vivência de cada ser humano. Houve, e não poderia ser diferente, deslizes na expressão escrita, contudo quer nos parecer que os problemas apresentados em algumas redações podem ser considerados normais nessa fase de aprendizado, na qual eles ainda não se aprofundaram nos estudos da gramática. Contrapondo o trabalho desenvolvido por estes alunos na fase de aprendizagem em que estão com os estudos de Alcir Pécora e Costa Val, pode-se dizer que esses alunos sabem escrever. É bem provável que parte desse sucesso se deva à instituição que com sua estrutura e metodologia de ensino os prepara bem para essa habilidade que se fundamenta na prática.
Quanto a nossa atividade a maioria deles optou por escrever textos a partir das imagens. Este foi um detalhe bastante curioso que fez com que a professora de português de ambas as turmas, descobrindo essa motivação deles para trabalharem com imagens pretendesse implantar atividades integradas com a professora de artes, através das quais eles desenvolvessem essa habilidade. Primeiro, eles criariam desenhos/imagens, posteriormente desenvolveriam suas redações a partir desse material imagético. A escola também utilizou o software desenvolvido pelos alunos do UniRitter num trabalho conjunto com a Escola Silva Paes.
Através de uma relação positiva e amistosa, procuramos ficar vigilantes interagindo com o grupo e percebemos que quando nos dirigíamos a eles, mostravam-se abertos e expunham suas dúvidas ou pediam sugestões. Por exemplo, uma menina não conseguia começar seu texto. Tomamos conhecimento da sua produção mental, então, sugerimos iniciar caracterizando o personagem. Ela sentiu-se mais confiante fez três parágrafos e chamou novamente, “agora quero mudar o curso da história mas não sei como fazer”. Sugerimos-lhe que levasse seu personagem a ver as coisas sob outro ângulo. Ela achou ótimo e concluiu a história. O que nos parece válido, em circunstâncias dessa natureza, é estimular o aluno a refletir, deixá-lo confiante para que ele próprio realize sua tarefa.
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