Quando li o título do texto, pensei que não ia gostar, pois não gosto de competições com vencedores e perdedores, a exemplo do jogo de tênis. Penso que perder e ganhar podem ter o mesmo peso, dependendo de como cada um reage e aceita um ou outro.
Rubem Alves |
Mas adorei!O texto é de uma sutileza e de uma verdade, que na medida em que ia lendo me inseri nele como personagem. Mas isto só aconteceu após uma sessão de psicoterapia na qual falamos sobre parte do texto e me encantei sobre ele. Já o havia lido, mas não dei tanta importância.
O relacionamento a dois não é fácil, nem difícil. Mas há que se ter certeza se estamos jogando tênis ou frescobol. Diante desta verdade, há necessidade de se dialogar com o parceiro, fazer uma escolha e tomar uma decisão. E então, decidirem se querem continuar no jogo ou mudarem. Ou encerrarem a partida antes do final.
No amor como no jogo, as pessoas cometem erros e aprendem com eles, ficam mais fortes e seguras. No amor podemos errar, mas é preciso saber se quer consertar o erro e continuar ou desistir. Você pode tudo, desde que você consiga conviver com o fato. E que sua tomada de decisão lhe faça mais feliz, que serene seu coração.
Cumplicidade, parceria, respeito, amor de verdade, tesão, diálogo e valorização do Eu e do Tu, são essenciais num relacionamento a dois.
Assim como no tênis, ao final de um casamento, aparentemente há sempre um perdedor. Para quem desejou a separação tudo começa a florir e a vida a sorrir. Para a outra parte, vem a tristeza, a descontinuidade da rotina, a reflexão e o arrependimento de não ter se esforçado mais. Para ambos a situação não é boa, nem ruim, mas real. Enquanto um vive novos e lindos sonhos, o outro vive momentos de amargura. Até que um dia surge uma nova situação e ambos passam a viver feliz novamente.
No seu relacionamento, pratique o jogo do FRESCOBOL verdadeiro, onde ambos ganham e ficam felizes. Mas seja honesto com você, o frescobol jogado só para agradar o outro ou por falta de outra opção, de coragem e de convicção precisa ter um fim. E não tenha medo de começar tudo novamente se você estiver jogando tênis no seu relacionamento.
E termino esta divagação sobre o casamento e os jogos, com o questionamento de Rubem Alves: “Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?”. Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar. [...]”.
Boa leitura e pense nisso! Se você responder essa pergunta de forma afirmativa, então você está no caminho certo.
TÊNIS X FRESCOBOL Crônica de de Rubem Alves
“Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.
Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele:
Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: “Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?”. Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.
Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O império dos sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra – é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: “Eu te amo, eu te amo…”. Barthes advertia: “Passada a primeira confissão, ‘eu te amo’ não quer dizer mais nada”. É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: “Erótica é a alma”.
O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada – palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.
O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra – pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir… E o que errou pede desculpas, e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos…
A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá…
Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Camus anotava no seu diário pequenos fragmentos para os livros que pretendia escrever. Um deles, que se encontra nos Primeiros cadernos, é sobre este jogo de tênis:
Cena: o marido, a mulher, a galeria. O primeiro tem valor e gosta de brilhar. A segunda guarda silêncio, mas, com pequenas frases secas, destrói todos os propósitos do caro esposo. Desta forma marca constantemente a sua superioridade. O outro domina-se, mas sofre uma humilhação e é assim que nasce o ódio. Exemplo: com um sorriso: “Não se faça mais estúpido do que é, meu amigo”. A galeria torce e sorri pouco à vontade. Ele cora, aproxima-se dela, beija-lhe a mão suspirando: “Tens razão, minha querida”. A situação está salva e o ódio vai aumentando.
Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão… O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.
Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem – cresce o amor… Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim…” (O RETORNO E TERNO, p. 51.)
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