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segunda-feira, 11 de abril de 2011

Cavador do Infinito - Cruz e Souza

Odete Soares Rangel

http://apod.nasa.gov/apod/image/0705/comacluster_spitzer_0.jpg
João da Cruz e Souza (1862-1898) nasceu em Desterro, hoje Florianópolis.  Descendente de escravos, teve sua vida marcada pelo preconceito racial. Ainda jovem sofreu uma desilusão amorosa quando se apaixonou por uma artista branca. Casou-se com a negra Gavita Rosa Gonçalves que veio a enlouquecer mais tarde. Apenas dois dos seus quatro filhos sobreviveram. Ele morreu aos 36 anos, vítima de tuberculose.  O drama da existência é tema recorrente na sua obra, observemos no soneto que segue.

Cavador do Infinito

Com a lâmpada do Sonho desce aflito
E sobe aos mundos mais imponderáveis,
Vai abafando as queixas implacáveis,
Da alma o profundo e soluçado grito.

Ânsias, Desejos, tudo a fogo escrito
Sente, em redor, nos astros inefáveis.
Cava nas fundas eras insondáveis
O cavador do trágico Infinito.

E quanto mais pelo Infinito cava
mais o Infinito se transforma em lava
E o cavador se perde nas distâncias...

Alto levanta a lâmpada do Sonho.
E como seu vulto pálido e tristonho
Cava os abismos das eternas ânsias!

Fonte do soneto: www.dominiopublico.gov.br

Cavador do Infinito é considerada uma das melhores poesias (soneto) filosóficas de Cruz e Souza. Ela busca questionar a razão e o fundamento da existência humana. Nesse soneto, pode-se perceber o drama existencial presente na ação de cavar o Infinito vivido pelo eu lírico. 

Os verbos Sobe e Desce na primeira estrofe representam essa ação de cavar realizada através da lâmpada do sonho. Enquanto cava, abafa as queixas e os gritos da alma. Sensações como ânsias e desejos, e os sonhos podem representar os anseios do escritor em viver uma história de vida diferente, de encontrar a felicidade não contemplada nas suas relações sociais e amorosas. 

"Cava os abismos das eternas ânsias!" A frase denota quase um desespero na busca desenfreada por algo não encontrado, mas que lhe causava aflição. O seu próprio eu está a escavar-se em busca de uma razão existencial, de respostas para suas agonias pessoais. 

É como uma ordem, cavar nas profundezas até chegar no abismo, pois ali se desfariam os mal estares e o eu lírico poderia ter paz, amar, ser feliz. Entretanto, pode-se depreender que,  até o final do soneto, o eu lírico não encontrou o que procurava, pois o Infinito se transformou em lava.  

Observemos que na primeira estrofe "Com a lâmpada do Sonho desce aflito" parece haver quase um desespero para chegar ao fundo e encontrar uma saída para suas aflições, se encontrar. Mas na última,  "Alto levanta a lâmpada do Sonho", o vulto pálido e tristonho não está a soluçar, mas a cavar tentando numa busca incessante chegar ao seu eu mais profundo e se libertar das agonias, embora nada mude.

Para quem tiver interesse na vida e obra do autor, há uma matéria muito interessante com o título CRUZ E SOUZA  *  SUA VIDA E OBRA ATRAVÉS DA PSICANÁLISE. Trata-se de uma conferência proferida pelo acadêmico Carlos José da Motta de Azevedo Corrêa, no Clube Doze de Agosto, Florianópolis, em 24 de novembro de 1941. A publicação está na Revista da Academia Catarinense de Letras, No 13 - Florianópolis - 1995. Pgs. 219 - 254.

2 comentários:

RHODOLFO LIRA disse...

MUY BIE , ME GUSTA MUCHO

Odete Rangel disse...

Obrigada Rhodolfo, literatura me encanta com suas multiplas leituras e sua diversidade de generos.
Abraco